No meu velho
quarto me encontro trancado em meio ao negrume, de olhos abertos, mas sem poder
enxergar um palmo da minha mão. Fico a observar o nada, tentando fitar algum
rastro de luz vindo lá da noite escura, pela janela do meu quarto,
transpassando a cortina azul. Porém, o céu da noite nada ilumina, apenas
enegrece mais o vazio que vai de mim para o exterior. Assim permaneço em
trevas, em busca de algo que não sei dizer, por isso nunca durmo, pois
necessito esperar sempre lúcido.
Lá fora
chove densamente. A água, que se sugere infinita, cai ensandecida e uniforme
num ritmo tão intenso que, parece querer opor o seu poder a todos os seres
terrestres. É como se quisesse engolir a cidade inteira.
Tudo o que
sinto agora é o barulho da chuva e, no estado em que estou, mergulhado na
fadiga de um dia enfadonho, meus sentidos parecem mais vivazes do que nunca.
Sinto a água escorrendo por cima do telhado e precipitando sobre o jardim,
molhando as rosas secas e outras plantas não menos amarrotadas. Delas as águas
gotejam até o chão formando uma série de ruídos semelhantes e não aleatórios,
que parecem querer fazer algum sentido no meio do chiado provocado pelo
conjunto da tempestade. É algo que eu nunca havia reparado antes, mas
mergulhando dentro desse chiado agressivo posso sentir lá no fundo um simbilar
de gotas que pendem sempre de maneira caótica. A água que escorre do telhado
faz ecoar um simbilante rasgado que se encontra com o simbilar das gotas no
jardim e o simbilar enfurecido das enxurradas, que são como chuvas terrestres
que se precipitam sempre em sentido horizontal, sem destino. O conjunto desses
sons forma uma melodia muito particular, algo que eu nunca tinha provado a
sensação. Pareço-me hipnotizado com o padrão encontrado na desordem da chuva.
Essa música, às vezes, confundem meus sentidos, pois sinto a água molhando todo
o exterior da casa, apesar de nada enxergar. Sinto a água dominando tudo ao
redor do meu lar, tal qual um aquário às avessas, onde sou um peixe que não
pode viver dentro do mar. Apenas observo sem poder nada ver.
A chuva é
espessa e bate nos muros com bastante ódio. Ela parece querer se aproximar mais
de mim, tentando penetrar a muralha que me mantém seguro. Pressagio a água
escorrendo por dentro das paredes do meu quarto, mas eu olho para os lados e
nada vejo, apenas sinto. A chuva parece dominar meu quarto, pois o chão
encharcado pressagio, e mesmo assim não tenho ânimo para pôr um dos meus pés no
chão para senti-lo umedecendo-se.
A melodia
simbilante continua em ritmo intenso, e quando mais eu me deixo ser dominado
por essa harmonia aquática, mais sinto meu quarto enchendo-se de água. Tenho a
impressão que a chuva está precipitando apenas dentro do meu quarto, pois olho
para a janela, transpassando a cortina azul para observar o céu, mas é em vão,
pois nada vejo, apenas sinto.
Deitado na minha cama
antiquada experimento a sensação de estar mergulhado dentro da água da chuva.
Sinto-me completamente molhado, mas estou enxuto. Sinto-me sufocado pela falta
de oxigênio, apesar de ele estar presente. Sinto-me tonto, com vontade de
desmaiar, mas acho que estou apenas com sono. E enquanto a música que simbila
infinitamente ao meu redor é executada pela chuva com maestria, sinto-me
sensibilizado a ponto de me afogar no seco.
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