terça-feira, 23 de setembro de 2014

Contos Mijinianos # 7 - Pânico na Páscoa

Num dia de páscoa, certa vez estava eu perambulando pelas ruas com um grande amigo, o Leo, conversando sobre histórias da infância, relembrando ‘traumas’ e situações embaraçosas que a gente já passou. Ele, aliás, teve um passado recheado de histórias em que o ‘chicote comia solto’, com uma mãe nordestina arretada que resolvia tudo na base da chinelada e do porrete! É sério, o negócio era tenso: se respondesse ela, ele levaria uma mãozada na boca; se apanhasse de alguém na escola levaria outra surra ao chegar em casa pra largar de ser mole; se chorasse apanharia para engolir o choro; e se não chorasse apanharia mais porque se não está chorando era porque não tinha apanhado o suficiente. Definitivamente Dona Marisa jamais se adaptaria aos tempos atuais com a lei Maria da Penha em vigor.
Fonte : (noticiasengracadas)

Entre as histórias tragicômicas que o Leo já vivenciou, uma me chamou bastante atenção pela peculiaridade dos fatos.  Estava ele e seus dois irmãos na cozinha de Dona Marisa brincando com ovos numa véspera de Páscoa, o que já não era lá uma boa ideia, sabendo o temperamento da mãe que eles tinham, entretanto, a inconsequência é uma das características básicas de um jovem pentelho. O objetivo da marmotagem era um arremessar ovos na direção do outro sem deixá-los quebrarem ou caírem no chão. Mas como cada um pensava em ferrar o outro, a malandragem era aumentar a força do arremesso ou então mirar numa posição nada estratégica para que o outro não conseguisse agarrar o ovo com facilidade. O resultado disso, como já era de se esperar, foi a cozinha virando um grande omelete. E a ficha dos irmãos caiu só após terem visto o resultado do estrago que fizeram na impecável cozinha de Marisa.
Após a bagunça Leo e seus irmãos trataram de dar uma faxina no local antes da mãe deles voltar do trabalho. Porém, esconder vestígios de sujeira de uma dona de casa que, no quesito “limpeza domiciliar”, é mais minimalista que um agente do FBI é uma grande perda de tempo. Dona Marisa chegou, repousou suas sacolas no sofá da sala, passou rapidamente pelo quarto dos garotos, um mais desconfiado que o outro, foi na cozinha e detectou panos de chão melados; paredes, geladeira e fogão manchados e a caixa de ovos vazia na geladeira. Leo e seus irmãos, por sua vez, já estavam sentindo que a mãe tinha descoberto o caos que eles protagonizaram. Enquanto estavam no quarto apreensivos olhando no rumo da porta, viram a mãe passar calmamente pelo quarto sem falar nada. Depois de uns cinco segundos ela surge de novo na porta berrando:
- QUE DIABOS ACONTECEU NA MINHA COZINHA SUAS PESTES DO CÃO ENDEMONIADO?!!!! BRINCANDO COM OVOS DE NOVO, MAS SERÁ POSSÍVEL?!!!
O irmão mais novo já começou a chorar, o do meio ficou num tremelique incessante e o Leo ficou implorando para não apanhar. Dona Marisa, todavia, prometeu que não ia dar uma surra neles naquele dia, porém, já que eles gostavam tanto de brincar com ovos ela iria propor uma brincadeira pra eles no dia seguinte, durante a páscoa, e jurou que seria bem divertido. Os rapazes, contudo, não estavam com um bom pressentimento a respeito disso.
Um dia depois estavam todos esperando para saber o que Dona Marisa estava preparando para os pestinhas. Ela inicialmente pediu que os três fossem na casa de uma tia deles buscar uma panela emprestada enquanto ela terminava de pintar e decorar uns ovos. Quando os meninos voltaram estava a mãe sentada no sofá da sala com um cinto na mão à espera dos filhos. Foi então que ela propôs a tal ‘brincadeira’ que tinha sido referida no dia anterior:
- Então, vocês não gostam de brincar com ovos em casa?! Então a gente vai brincar bastante hoje. Sabe aqueles ovos que eu estava cozindo e decorando lá na cozinha? São nossos ovos de páscoa e a brincadeira que eu proponho é uma caça aos ovos. Vocês já fizeram isso em outras páscoas, se lembram? Pois é, o objetivo é o mesmo, a diferença é que quem não achar os ovos vai apanhar de vara até perder a força nas pernas! Não é divertido?
O irmão mais novo começou a chorar, o do meio começou a pedir perdão, prometendo que nunca mais faria bagunça na cozinha e Leo questionou:
- E quem achar um ovo tá livre da surra?
Dona Marisa esclareceu:
- Da surra, sim, mas não do castigo de 2 meses sem mesada, videogame, computador e sair pra rua...
O irmão mais novo raciocinou:
- E quem apanhar está livre do castigo?
- Não!!! – Esbravejou a mãe razinza. E o menino voltou a chorar.
Dona Marisa ainda acrescentou:
- E vocês têm meia hora pra encontrar os ovos! Se esgotar o tempo o ‘couro vai comer’ aqui hoje!! E o tempo já está passando corre, corre!
E foram os três correndo desesperadamente pela casa. Leo corria de cômodo em cômodo vasculhando cada perímetro da casa e nada. Ninguém imaginava quão difícil poderia ser encontrar um ovo escondido dentro da própria casa. Além disso, ninguém sabia quantos ovos eram afinal de contas. E se fosse um para ser disputado pelos três, tal qual ‘Jogos Vorazes’, onde apenas um sobreviveria? Ou será que seria mesmo um ovo para cada um dos irmãos? Talvez não houvesse nenhum ovo escondido e a surra seria iminente. Enfim, a questão era que o tempo estava correndo e nada de ovos decorados. Leo vasculhou dentro das gavetas, atrás do armário, dentro das lixeiras, debaixo do sofá, até nos locais mais improváveis, como dentro do ralo do banheiro. Quando estava certo de que não havia nenhum ovo escondido ouviu um grito do irmão mais novo:
- Achei!!! – Exclamou o garoto vitorioso.
- Onde achou este ovo? – Indagou Leo.
- Debaixo do travesseiro da sua cama.
- Como assim, eu olhei umas três vezes lá e não encontrei nada. Deixa eu ver. – Leo, ao pegar o ovo percebeu que ele nem era de chocolate, era apenas um ovo de galinha com casca pintada. Quando foi entregar para o irmão mais novo o outro chegou de supetão e tomou o ovo da mão de Leo e se pôs a correr:
- Achei um ovo! – E enquanto corria saltitante com o ovo do irmão mais novo pela casa, o irmão do meio não foi capaz de prever uma cintada que veio na velocidade da luz diretamente nas suas pernas, o fazendo cair já chorando.
- Isso é pra você aprender a não trapacear! Não criei filho meu pra ser vigarista! – Esbravejou Dona Marisa. O irmão mais novo presenciando aquela cena correu logo em seguida para zombar do azar do seu irmão caído no chão choramingando:
- Bem feito, bem feito! – Quando, de repente um “SHILAPT” fez um sorriso se transformar num choro.
- E isso é para você aprender a deixar de ser lerdo, não criei filho meu pra ser passado pra trás pelos outros! – E virando na direção de Leo completou: E você, ainda lhe falta 5 minutos para ser o próximo a apanhar.
Fonte: (efbafamiliafeliz)

Sabendo das suas chances ínfimas de encontrar outro ovo pela casa, Leo decidiu arriscar tudo ou nada com um plano audacioso. Enquanto a mãe megera estava no quarto com os outros irmãos ele correu para cozinha e encontrou as tintas e o pincel que a mãe usou para decorar os ovos. Foi na geladeira, pegou um ovo e, lembrando como o outro estava pintado, tentou reproduzir exatamente o mesmo desenho na casca do que ele possuía. Correu até a sala sacudindo o ovo com a mão para a tinta secar rapidamente e esperou pela Dona Marisa. Após ter encerrado o tempo de caça aos ovos, a mãe encontrou o filho na sala com o ovo na mão e disse:
- Parabéns! Parece que você encontrou mesmo mais um ovo. Onde foi que você achou esse, posso saber?
Leo começou a suar frio, desconfiando que a mãe já soubesse que aquele ovo não era um dos que ela tinha escondido.
- É... – Leo pensou e pensou e por fim disse – No seu quarto. – Enquanto Marisa o encarava fixamente com o olhar nos seus olhos. Depois de um tempo de silêncio ela respondeu:
- Muito bem. – E saiu em direção ao banheiro. Leo respirou aliviado, mas depois de um tempo ela voltou e disse:
- Ah sim, a proposito, pode comer o seu ovo.
- Comer? Mas não é de chocolate, é de galinha.
- Sim, mas eu os cozi antes de esconder e sei que você adora ovo cozido...
- Hum... bem... eu não tô com muita fome e tenho a impressão de que esse ovo nem está tão bem cozido. – Diz Leo sem saber mais o que justificar pra sua mãe.
-Sério?! Deixa eu ver aqui – Dona Marisa pegou o ovo, apalpou, observou o desenho da casca, pensou e depois concluiu:
- Só tem um jeito de a gente descobrir se este ovo está bem cozido ou não.
- Como? – Indagou Leo curioso.
- Assim! – E Dona Marisa pegou o ovo e quebrou na cabeça de Leo fazendo uma grande meleca no cabelo dele. – Realmente, este ovo não estava bem cozido. Provavelmente nem era um dos ovos que escondi né Leo?! – Leo abriu o berreiro e se entregou, pois viu que não podia competir com a mãe dele. Mas se ele achava que isso era tudo, estava completamente enganado:
- Não chora não, você não apanhou ainda. Passa pro banheiro e vai pra debaixo do chuveiro porque é lá que você vai apanhar pra aprender a não mentir nunca mais pra mim! Não criei filho meu pra ser mentiroso! – E lá se foi meu amigo para mais uma surra inesquecível.

Depois de ouvir essa história eu compreendi porque Leo detesta tanto a Páscoa e até ovos de chocolate ele nem quer ver na sua frente. Mesmo assim ele disse que aprendeu muito com a convivência conturbada com Dona Marisa, não se arrepende de ter apanhado e também pôde tirar algumas boas lições disso tudo. Já Dona Marisa, quando Leo conta essas histórias do passado para ela, esta apenas dá uma gargalhada e diz não se lembrar de nada disso.

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